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18/08/2016 | Pacote anticorrupção gera dilema entre parlamentares no Congresso

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Aprovação de medidas sugeridas pelo MPF seria chance para melhorar imagem do Legislativo, mas há resistência em aceitar alguns pontos

Pacote anticorrupção gera dilema entre parlamentares no Congresso Luis Macedo/Câmara dos Deputados / Divulgação

Deputados devem fazer alterações no texto antes de votação e encaminhamento para o Senado Foto: Luis Macedo / Câmara dos Deputados / Divulgação

Uma encruzilhada surge no horizonte dos deputados com a criação de comissão especial para analisar as 10 medidas de combate à corrupção sugeridas por procuradores do Ministério Público Federal (MPF). Se aprovarem as propostas, rigorosas nas ações contra o crime de colarinho branco, os parlamentares poderão mostrar conexão com os anseios populares, disposição para enfrentar a chaga da fraude tanto no setor público quanto no privado e, de quebra, conquistariam melhora na pisoteada credibilidade do Congresso.

Embora as possibilidades pareçam convidativas, há resistências: aprovar as sugestões na forma em que estão prejudicaria diretamente parte da classe política que está no alvo de investigações, com aumento de penas mínimas, restrição de habeas corpus, criminalização do caixa 2 e do enriquecimento ilícito e redução drástica das hipóteses de prescrição.

— Seria muito positivo, repercutiria bem na imagem da instituição. Mas o que viria depois? Existe uma análise de consequências. Estima-se que um terço dos deputados responda a algum processo judicial. Vão jogar 150 ou mais deles na Comissão de Ética? — analisa o professor de Ciência Política Ricardo Caldas, da Universidade de Brasília (UnB), projetando que grupos de parlamentares tentarão obstruir o avanço do projeto.

Diante desse cenário, apresenta-se a encruzilhada. A Câmara, do ponto de vista político, não pode simplesmente anunciar que não concorda com as 10 medidas, amparadas pelo apoio de quase 3 milhões de brasileiros que assinaram pedido de encaminhamento ao legislativo. Ao mesmo tempo, as propostas, sobretudo em tempos de Operação Lava-Jato, soam ameaçadoras. A discussão fica no fio da navalha.

— Se o Congresso não mudar nada ou ficar só na perfumaria, vai prestar grande desserviço. A situação para aprovar é difícil, mas a população é unânime ao exigir que haja honradez, decência e dignidade no exercício da coisa pública. É uma oportunidade — afirma o deputado federal Antonio Carlos Mendes Thame (PV-SP), signatário do projeto com as sugestões do MPF e presidente da Frente Parlamentar de Combate à Corrupção.

Mendes Thame avalia que o fim da prescrição dos crimes de colarinho branco — instrumento fonte de impunidade — é uma das medidas mais relevantes a serem aprovadas pelo Congresso.

— A lei não tem efeito retroativo. Por essa razão, achamos um absurdo que alguns deputados que defendem corruptos e a indústria da impunidade estejam combatendo as 10 medidas — afirma o parlamentar.

O juiz Sergio Moro, que preside os processos da Lava-Jato em primeira instância, participou de uma sessão da comissão especial da Câmara no dia 4 deste mês, garantiu ser favorável às propostas e adotou tom elogioso ante a disposição da Casa em debater o tema.

— Isso significa que o Congresso pretende apresentar resposta à questão da corrupção sistêmica.

É algo que dá esperança — destacou Moro, que apontou a possibilidade de ser iniciado um círculo virtuoso na política nacional.

Relator do projeto das 10 medidas na comissão especial, o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS) entende que, apesar das pressões, um texto equilibrado e a pressão popular serão fundamentais para garantir a aprovação no Congresso. Segundo o parlamentar, até o momento, ninguém lhe ofereceu um texto alternativo para afrouxar as normas apresentadas pelos procuradores do MPF.

AS 10 MEDIDAS

1 – INVESTIR EM PREVENÇÃO

Aplicar testes de integridade a servidores, simulando situações sem seu conhecimento (como oferta de propina) para avaliar condutas. Assegurar o direito de o Ministério Público manter sob sigilo a identidade de informantes que contribuem nas investigações de atos de corrupção.

2 – CRIMINALIZAR ENRIQUECIMENTO ILÍCITO

Transformar em crime o enriquecimento ilícito de agentes públicos, com pena de três a oito anos de prisão. A pena será dobrada se os bens estiverem em nome de terceiros para ocultar o verdadeiro dono.

3 – AUMENTO DAS SENTENÇAS

Ampliar penas mínimas para corrupção (de dois para quatro anos de prisão), escalonar penas segundo o valor desviado e transformar em crime hediondo a corrupção de valores acima de cem salários mínimos (R$ 88 mil). Para crimes de “colarinho branco”, quanto maior o dano, maior será o tempo de prisão (até 25 anos, quando superar R$ 8 milhões).

4 – EFICIÊNCIA DOS RECURSOS PENAIS

Alterar a legislação para evitar as manobras usadas para prolongar processos. Uma das mudanças é a possibilidade de execução imediata da condenação se o tribunal identificar abuso do direito de recorrer, além de multa de 10 a cem salários mínimos quando for comprovado recurso com efeito protelatório.

5 – CELERIDADE NAS AÇÕES

Criar varas, câmaras e turmas especializadas para julgar ações de improbidade administrativa e decorrentes da lei anticorrupção e permitir que o MPF firme acordos de leniência em processos de improbidade e limitar a uma única vez as apresentações de defesa.

6 – REFORMA NAS PRESCRIÇÕES

Alterar artigos do Código Penal que tratam da prescrição (quando um crime não pode mais ser punido) para corrigir supostas distorções do sistema.

7 – AJUSTES NAS NULIDADES PENAIS

Redefinir o conceito de prova ilícita e revisar as hipóteses de anulação. Com isso, a defesa poderá usar, por exemplo, elementos com finalidade de demonstrar a falsidade de prova produzida pela acusação, desde que não sirva para agravar a pena do réu.

8 – CADEIA PARA O CAIXA 2

Com pena de quatro a cinco anos de prisão, responsabilizar partidos políticos e criminalizar o caixa 2. Mesmo assim, dirigentes de legendas poderão ser criminalizados de maneira individual.

9 – PRISÃO PREVENTIVA ASSEGURANDO A DEVOLUÇÃO DO DINHEIRO

Prever a possibilidade de prisão preventiva para evitar que o dinheiro vindo de crimes se perca e não possa ser recuperado (caso de suspeitos que ocultam recursos fora do país). Determinar que bancos informem em, no máximo, 20 dias, dados de movimentações financeiras suspeitas.

10 – RECUPERAÇÃO DO LUCRO DO CRIME

Criar o “confisco alargado” para obrigar os condenados a devolverem todo o dinheiro da sua conta, exceto os recursos com origem legal comprovada. A acusação terá de comprovar a diferença entre o patrimônio ilegal em nome do acusado ou por ele controlado e seus rendimentos.

Pontos provocam críticas e devem ser revistos

Embora contem com apoio popular, as 10 medidas contra a corrupção, diante da intensificação do debate sobre o conteúdo, passaram a receber críticas e ponderações. Em discussão que transcende o fato de ser prejudicado ou não pela rigidez das mudanças sugeridas, setores indicam pontos “draconianos” do projeto de lei com potencial para, eventualmente, fragilizar o direito de defesa, afrontar a presunção de inocência, cercear a liberdade partidária e estabelecer um estado de caça às bruxas.

A possibilidade de cassar o registro e fechar um partido político por prática de caixa 2 é uma das ideias criticadas. O próprio deputado Mendes Thame (PV-SP), que assinou o projeto, considera a medida excessiva.

— É uma consequência da lei, mas acho muito difícil extinguir um partido. Os equívocos e crimes são das pessoas, não dos partidos — avalia o parlamentar.

O teste de integridade, simulação para checar se um agente público aceitaria propina, por exemplo, também é alvo de análises negativas. São recorrentes perguntas sobre o controle, a frequência e a consequência dos testes, além da possibilidade de indução do indivíduo ao ilícito.

A prisão preventiva, antes da condenação, para facilitar a recuperação de recursos desviados suscita indagações sobre o seu grau de justiça se, ao final do processo, o réu for inocentado. Também neste rol está a sugestão para que as provas ilícitas possam ser usadas em processos, desde que obtidas de “boa-fé”.

— É um verdadeiro atentado à Constituição. É inadmissível. Não se pode pretender combater um crime cometendo outro. Abrir a porta para o uso de prova ilícita é abrir a possibilidade de se criar um vale-tudo no processo — diz Cláudio Lamachia, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

A entidade atuou pela aprovação da Lei da Ficha Limpa e pela proibição de doações empresariais de campanha e é favorável à criminalização do caixa 2, mas Lamachia lista outros itens das medidas que considera perigosos, como a limitação das hipóteses de habeas corpus:

— Na história, só tivemos um momento de restrição ao habeas corpus, na ditadura. Não podemos retroceder dessa maneira.

Diante dos impasses, o relator na comissão especial, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), avalia fazer adequações no texto final, que estará em um substitutivo redigido por ele. Uma das mudanças ocorrerá no teste de integridade, que, pela proposta original, seria obrigatório somente aos servidores das polícias.

— A sugestão é de que o teste somente seja feito em caso de suspeita de prática de corrupção, com o conhecimento e autorização da Justiça. Dessa forma, conseguimos trazer ao Brasil um instrumento que obteve sucesso em outros países — avalia Onyx.

O parlamentar também projeta adaptações no item que permite o uso de prova ilícita:

— Há uma série de salvaguardas na Constituição e na tradição do direito brasileiro sobre a licitude das provas, faz parte das garantias individuais. Ao mesmo tempo, várias operações foram derrubadas por ilicitudes que nada mais eram do que detalhes técnicos.

Onyx também decidiu incrementar o projeto com a criação da figura do denunciante de esquemas de corrupção. O informante poderá até ser premiado com valores em dinheiro. A regulamentação do lobby, que pode ser outro acréscimo, é analisada.

Por: Carlos Rollsing – Jornal Zero Hora

 

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